quarta-feira, 11 de junho de 2008

D&D 4ª Edição e o Roleplay

Tenho lido em vários fóruns, blogs e listas de discussão sobre a 4ª Edição e do quanto ela não prioriza a interpretação. Aqueles que defendem o sistema dizem que o roleplay varia de grupo para grupo, e não será um sistema de regras que irá modificar essa dinâmica. Os que acusam dizem que não existe nenhum suporte do sistema para que jogadores novatos ou mesmo os mais experientes se baseiem para sua interpretação.

Pois bem. Sou da opinião de que a 4º Edição dá suporte sim, e um bom suporte, para a interpretação dos personagens. O que a Wizards não faz é evidenciar de maneira mais clara e objetiva o seu conteúdo para que ele seja mais bem aproveitado pelos jogadores. Eu explico.

Muitos jogadores escolhem raça e classe pensando no visual que o personagem terá, ou no tipo de poderes que terá à sua disposição, ou porque imaginou uma história legal que combinaria melhor com esta ou aquela raça. Mas não é só isso que elas oferecem.

Quando escolhemos a raça e a classe no D&D, estamos, principalmente, escolhendo e definindo a personalidade do personagem.

Escolher raça e classe não definem apenas seus poderes e habilidades, mas também grande parte de sua personalidade. Isso é que não foi devidamente explorado e explicitado nos livros. Grande parte do sistema de regras que envolvem classe, raça, atributos, perícias, alinhamento e até mesmo as funções de personagem, podem e devem ser usadas para favorecer o roleplay e não apenas lhe garantir poderes e habilidades. Vamos ver como isso funciona.

Vou usar a raça Elfo do novo Players Handbook como exemplo. Na página 41 do livro, temos um tópico chamado Elf Characteristics, onde constam as seguintes características: agile, friendly, intuitive, joyful, perceptive, quick, tempestuous, wild. Numa tradução livre e despretensiosa, temos: ágil, amigável, intuitivo, festivo, perceptivo, rápido, tempestuoso e selvagem.

Todas essas características são traços de personalidade. O livro não detalha e nem descreve a função desse parágrafo em particular, mas imagino que essas são as características mais freqüentemente encontradas entre os membros dessa raça, logo, não seria difícil imaginar que o seu personagem poderia ter, pelo menos, três dos oito traços de personalidade aqui listados.

Não indo muito longe, apenas consultando um dicionário de psicologia e a wikipedia, consegui essa descrição para esses oito traços.

Ágil e Rápido
Coloquei essas duas características juntas porque elas remetem a um traço em comum. Apesar de serem traços físicos, elas dizem muito da personalidade de quem as têm. Uma pessoa ágil e rápida o é não apenas fisicamente, mas em todo o seu modo de agir. Isso poderia significar que é o tipo de pessoa que não planeja muito as suas ações, que é mais impulsiva, tem quase a necessidade de resolver seus problemas de forma rápida. Mesmo numa simples conversa, esse personagem tentará ser objetivo e claro, detestando grandes negociações ou o uso excessivo da diplomacia.

Amigável
Esse traço mostra que é o tipo de personagem mais tolerante, pois para ser amigo de muitas pessoas é preciso, muitas vezes, deixar as diferenças de lado. Mostra também uma disposição em querer ouvir e agradar ás pessoas próximas, em querer estar presente e ajudar nas horas em que as coisas apertam. É o tipo de pessoa que não fugiria sozinho e deixaria um amigo para trás.

Intuitivo
Ser intuitivo significa ter uma percepção da vida e de si mesmo muito própria. Significa estar em contato profundo e freqüente consigo mesmo. Personagens intuitivos usam sua própria experiência e conhecimento de si mesmo para se guiar na vida, tanto para escolher e tomar decisões quanto para traçar os próprios objetivos. Por isso mesmo, são muito seguros de suas decisões. Olhando essa característica em conjunto com as demais, eu diria que a comunhão que os elfos mantiveram com a natureza lhes deram essa característica particular.

Perceptivo
Personagens perceptivos estão em constante contato com o ambiente ao seu redor. É o tipo de pessoa que ao mesmo tempo que conversa com você está ouvindo o que o feirante está dizendo lá adiante e vendo um pássaro pousar numa árvore distante. Essas são pessoas atentas, que não deixam escapar nada ao seu redor.

Tempestuoso e Selvagem
Essas características mostram uma personalidade que tem sentimentos fortes e que estão a flor da pele. Personagens assim são agressivos (não necessariamente violentos), deixam-se envolver por suas paixões, são impetuosos, buscam seus desejos sem medir as dificuldades ou os esforços necessários. Essa paixão toda está em suas palavras, que são proferidas carregadas com muita emoção e vivacidade.

Esta aí. Algo que a Wizards poderia ter feito e não fez. Já que foram gastas tantas páginas com descrição de poderes, porque não usar pelo menos uma para fazer o que fiz acima? Já que existe tanto material descritivo e de apoio para o jogador criar o seu personagem, porque não incluir também aquelas poucas linhas explicando como aquilo pode afetar a personalidade do personagem e, conseqüentemente, sua interpretação? Mistério.

Apesar dessa não ser a ênfase dessa edição, pelo menos eles deixaram registradas características que, com um pouco de trabalho, podem ser usadas na interpretação. Logo, esse detalhamento e aprofundamento de características que foram expostas no livro apenas em um parágrafo de duas linhas, pode ser feito para todas as raças e classes do livro.

Por isso, não concordo quando dizem que o D&D não favorece a interpretação. É preciso ter um olhar diferenciado para cada palavra e conceito usado nas descrições e um certo trabalho para desenvolvê-las. Mas que essas características estão lá, estão.

Um comentário:

Anônimo disse...

Concordo com você. O D&D nunca foi um primor em incentivar a interpretação, mas nem por isso eu a ignorava em meus jogos, assim como nunca deixei de criar bons combates no Vampiro. As pessoas, às vezes, confundem o sistema de RPG como um objetivo, ao invés de usá-lo como meio.